quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Tirania do Auxílio


"Veja agora bem o que isto representa... Um grupo pequeno, de gente sincera (garanto-lhe que era sincera!), estabelecido e unido expressamente para trabalhar pela causa da liberdade, tinha, no fim de uns meses, conseguido só uma coisa de positivo e concreto - a criação entre si de tirania. E repare que tirania... Não era uma tirania derivada da ação das ficções sociais, que, embora lamentável, seria desculpável, até certo ponto, ainda que menos em nós, que combatíamos essas ficções, que em outras pessoas; mas enfim, vivíamos em meio de uma sociedade baseada nessas ficções e não era inteiramente culpa nossa se não pudéssemos de todo fugir à sua ação. Mas não era isso. Os que mandavam nos outros, ou os levavam para onde queriam, não faziam isso pela força do dinheiro, ou da posição social, ou de qualquer autoridade de natureza fictícia, que se arrogassem; faziam-no por uma ação de qualquer espécie fora das ficções sociais, uma tirania nova. E era uma tirania exercida sobre gente essencialmente oprimida já pelas ficções sociais. Era, ainda por cima, tirania exercida entre si por gente cujo intuido sincero não era senão destruir tirania e criar liberdade.

``Agora ponha o caso num grupo muito maior, muito mais influente, tratando já de questões importantes e de decisões de caráter fundamental. Ponha esse grupo a encaminha os seus esforços, como o nosso, para a formação de um sociedade livre. E agora diga-me se através desse carregamento de tiranias entrecruzadas V. entrevê qualquer sociedade futura que se pareça com uma sociedade livre ou com um humanidade digna de si própria...'''

- Sim: isso é muito curioso...

- É curioso, não é?...E olhe que há pontos secundários também muito curiosos... Por exemplo: a tirania do auxílio...

- A quê?

- A tirania do auxílio. Havia entre nós quem, em vez de mandar nos outros, em vez de se impor aos outros, pelo contrário os auxiliava em tudo quanto podia. Parece o contrário, não é verdade? Pois olhe que é o mesmo. É a mesma tirania nova. É do mesmo modo ir contra os princípios anarquistas.

- Essa é boa? Em quê?

- Auxiliar alguém, meu amigo, é tomar alguém por incapaz; se esse alguém não é incapaz, é ou fazê-lo tal, ou supô-lo tal, e isto é, no primeiro caso uma tirania, e no segundo um desprezo. Num caso cerceia-se a liberdade de outrem; no outro caso parte-se, pelo menos inconscientemente, do princípio de que outrem é desprezível e indigno ou incapaz de liberdade."
O Banqueiro Anarquista, Fernando Pessoa.

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Olá. Chamo-me Maria. Obrigado por visitar meu cantinho de luxos! Sou fashionista desde que me lembro e este é o meu blog. É um blog sobre estilo, sobre a vida, sobre o meu trabalho e sobre tudo o que me inspira a criar. Sou do Porto e nasci em 87. Sou dinâmica e sonhadora e para além da moda tenho uma empresa de Cake Design. Já criei outras como a Kitsune Sucrée de consultoria de imagem e o Vila Real Canal, um canal de tv online. Estudei Design na Faculdade de Belas Artes do Porto e Gestão Hoteleira na Escola de Hotelaria e Turismo do Porto. Sou também uma entusiasta dos trabalhos manuais, ilustradora e escritora de romances e livros infantis.